Quarta, 07 Agosto 2013 10:43

Relatórios e análise da concessão de transporte coletivo

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andre costaA equipe de professores e pesquisadores da USP apresentou dia 29 de julho o resultado do relatório de avaliação da concessão do transporte coletivo em Ribeirão Preto, solicitado pelo Ministério Público do Estado de São Paulo. Sua principal conclusão foi que a prefeitura Municipal precisa criar um Sistema de Controle do Transporte Coletivo de Ribeirão Preto que inclui a gestão do contrato e seu controle técnico financeiro.

As apresentações podem ser acessadas clicando em: "tarifa e equilíbrio do Transporte Coletivo em Ribeirão Preto" e "análise do primeiro reajuste do contrato de concessão".

O vídeo completo da apresentação está disponível no IPTV da USP. Para assistir, basta clicar aqui.

No artigo abaixo, o professor André Lucirton Costa, coordenador do estudo, descreve como foi o processo de  construção do relatório e algumas de suas conclusões: 

Estudo sobre a Concessão do Transporte Coletivo Urbano de Ribeirão Preto

* André Lucirton Costa

     Um contrato é a formalização de um acordo de vontades entre duas ou mais partes. Suas cláusulas criam "leis entre as partes", resguardados pela segurança jurídica do País. Os contratos da administração delegam ao poder público prerrogativas excepcionais para defesa do interesse público. Buscando controlar este poder e dar estabilidade às relações econômicas com o Estado, a Constituição do País criou instrumentos de controle sobre a administração pública, para evitar abusos da autoridade pública e garantias individuais. Um destes instrumentos é o equilíbrio econômico financeiro, muito usado no passado quando a inflação superava dois dígitos em poucos dias. Um pequeno atraso no pagamento poderia ser fatal a pequenas empresas.

     O trabalho desenvolvido por professores da FEA-RP seguiu estes princípios: do contrato administrativo e do equilíbrio econômico financeiro. Numa primeira etapa, foi analisado como o contrato foi elaborado, remetendo ao processo de licitação. Nas compras públicas, a lei determina que a administração especifique detalhadamente todo o serviço, obra ou produto que será adquirido. A engenharia denomina estas especificações de projeto básico (um pouco menos detalhado) ou projeto executivo (muito detalhado).

     As especificações possibilitam à administração pública estimar quanto se pagará por aquela obra ou serviço e cria um preço de referência para que se possa analisar as futuras propostas. Além disto, a especificação permite aos participantes da licitação formar seus preços, com a análise de cada insumo, de todos os detalhes daquilo que o setor público necessita.

     Partiu-se então para análise da formação do preço de referência da licitação do Transporte Coletivo de Ribeirão Preto, com a verificação da especificação que constava no edital e seus anexos (documentos base da licitação). O estudo se restringiu a formação do preço, não entrando em considerações técnicas de engenharia.

     Foram analisados os projetos básicos da rede e oferta do serviço (rotas, itinerários, frequência dos ônibus); especificação dos veículos; terminais e estações; corredores operacionais; controle da operação e da segurança; informação ao passageiro e ao cidadão; cobrança e sistema de arrecadação; sistema de controle da arrecadação e da tarifação; atendimento ao passageiro preferencial; e o sistema de controle da gestão pública. Além disto, foram analisados os estudos de demanda e demográfico.

     Todos estes elementos apresentados estavam com seu projeto básico especificado e continham estimados os elementos de formação de preço e de consumo. Com estes elementos foi possível estimar os custos fixos, custos variáveis e os investimentos do sistema de transporte coletivo.

     A Transerp usou dois modelos de referência: uma planilha de cálculo de custo de transporte criada pelo Ministério dos Transportes, que fornece uma estimativa da tarifa; e uma planilha de fluxo de caixa. O primeiro é um modelo de curto prazo que dá referências de consumos (dos ônibus) aceitas nacionalmente; o segundo é um modelo financeiro que leva em conta o tempo e utiliza os referenciais de consumo do primeiro.

     O objetivo é o de retorno do investimento, ou seja, o fornecedor realiza os investimentos (veículos, principalmente) para administração pública e tem seus recursos retornados no longo prazo (20 anos), a uma determinada taxa de retorno do investimento (semelhante a juros). Foram feitas duas estimativas de taxa de retorno, uma com aumento gradativo da demanda (11,32%), e outra sem amento da demanda (8,62%). Estas taxas de retorno previstas pela Transerp estão dentro das expectativas e dos riscos associados a esta operação. O equilíbrio financeiro significa manter a taxa de retorno dentro desta variação, caso haja alguma imposição unilateral do poder público.

     Não houve pelos documentos analisados, nada neste processo tão grave que pudesse levar ao rompimento do contrato. Além disto, as especificações e detalhamentos necessários para buscar os números da tarifa básica criaram, pela primeira vez no transporte público de Ribeirão Preto, um planejamento de longo prazo e uma possibilidade efetiva de controle sobre a operação e investimentos. Os elementos desta especificação vão permitir, por exemplo, criar um plano contábil para controlar o consórcio vencedor. O controle da contabilidade, com auditoria independente e demonstrativos públicos, vai permitir a análise das estimativas de consumo e de preço com reflexos direto sobre a tarifa. No modelo anterior, nada disto existia e o controle financeiro era tecnicamente impossível.

     Por este motivo, os professores da FEARP sugeriram a importância da manutenção do contrato e estão convencidos que ele trará benefícios para o município. Caso a Prefeitura (através da Transerp) adquira capacidade de gestão e de controle (hoje não tem - ênfase nosso), a população sentirá reflexos de médio prazo na qualidade e no custo do sistema. Neste sentido, a fiscalização por parte da imprensa e dos movimentos sociais será determinante.

     Concretamente, há muitas possibilidades de melhorias, preservando o contrato, mantendo o equilíbrio financeiro. São quatro os componentes básicos que podem afetar a tarifa: a demanda, os custos de operação e os investimentos e o prazo. (1) Os custos de operação podem ser reduzidos se houver a diminuição dos impostos sobre os insumos (diesel, peças etc.); se houver uma melhoria tecnológica nos roteiros e equipamentos, como por exemplo aumento da velocidade média do ônibus via corredor exclusivo, ou se forem utilizados os espaços de estacionamento em grandes avenidas para criação de faixas exclusivas. (2) Os custos de investimentos também podem diminuir com a retirada dos impostos da compra do ônibus; com o financiamento do investimento por outra fonte que não a tarifa, como o PAC, Fundo Municipal do Transporte Coletivo – composto pelas receitas de multas, Área Azul e estacionamentos municipais, verba de publicidade, outorga onerosa para grandes empreendimentos etc. (3) Finalmente, é imperativo aumentar a demanda com políticas de comunicação, marketing e de melhoria da qualidade, frequência, rapidez, custos e pontualidade do sistema; pode-se também induzir o desestímulo ao uso do carro, com a criação, por exemplo, do rodízio de placas e a criação de linhas especiais (de luxo) com percursos diferenciados (aeroporto por exemplo).

     Neste sentido, o planejamento de 20 anos é importante para controlar e poder comparar os resultados de ações amplas de mobilidade que estão dentro deste período de contrato. Dentre estas ações que devem ser discutidas pela sociedade, podem estar a criação de ciclovias, aluguel público de bicicletas (como já existe no Rio de Janeiro e Sorocaba), criação de estacionamentos em terrenos da Prefeitura, utilização dos terrenos da ferrovia para criação de corredores e ciclovias; a criação de um Instituto de Desenvolvimento da Mobilidade de Ribeirão Preto com a participação das universidades, cadeia de produção e serviços de transporte coletivo, setor público, sociedade civil para realizar projetos de pesquisa para melhoria do trânsito.

     Outros debates podem ir além do período de contrato, como o metrô, VLT (veículo leve sobre trilhos), o pedágio urbano para desestimular o uso do automóvel etc.. A sociedade precisa criar um transporte atrativo que possa concorrer com as vantagens de mobilidade do carro individual.

* André Lucirton Costa, pesquisador do CEPER/Fundace e professor do Departamento de Administração da FEA-RP, coordenou o grupo de pesquisadores da USP que realizou o estudo sobre a Concessão do Transporte Coletivo Urbano de Ribeirão Preto a pedido do Ministério Público do Estado de São Paulo.

Lido 4667 vezes Última modificação em Quarta, 07 Agosto 2013 10:53